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Pensando a ressignificação do Currículo na perspectiva da Educação Integral

Educação Integral em prol da formação de seres humanos completos

Publicado em: 18/12/2015 15h31 | Atualizado em: 30/11/2020

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A perspectiva da Educação Integral impulsiona a demanda da construção de um currículo que conceba os educandos e educandas como produtores e produtoras de conhecimentos e que propicie o desenvolvimento de todas as potencialidades ou dimensões formativas dos sujeitos.

A defesa de uma construção da Educação Integral na Rede Municipal de Ensino de São Paulo é fundamentada pela premissa máxima de possibilitar as condições de construção de conhecimentos que favoreçam o desenvolvimento dos educandos e educandas em todas as suas dimensões e culturas e, acima de tudo, que atue contra a lógica que produz a “incompletude” e a relação desapaixonada com o conhecimento.

O texto traz reflexões sobre a necessidade de ressignificação das práticas educativas sustentadas por currículos e matrizes curriculares que não apenas se distanciaram das experiências vividas nos territórios, como também, elegeram uma cultura a ser instituída às custas do silenciamento de muitas outras. Ainda destaca as propostas de Educação Integral em Tempo Integral para a Educação Infantil e o Ciclo de Alfabetização e a importância da ludicidade na organização do Currículo.

Clique aqui e conheça a íntegra do capítulo “Pensando a ressignificação do Currículo na perspectiva da Educação Integral”

Clique aqui e veja o documento orientador “São Paulo Integral – ampliando e construindo novos caminhos pedagógicos” na íntegra.

Pensando a ressignificação do Currículo na perspectiva da Educação Integral


(…) a maneira pela qual a educação ocidental tem crescido ao longo dos últimos
séculos, especialmente com a industrialização, foi basicamente, não para criar seres
humanos totalmente preparados para lidar com a vida e todos os problemas dela, cidadãos
independentes capazes de exercitar suas decisões e viver suas responsabilidades em
comunidade, mas sim elementos para alimentar um sistema de produção industrial. Eles eram
produtos, com conhecimento parcial… Nós migramos da sabedoria para o conhecimento, e
agora estamos migrando do conhecimento para a informação. E essa informação é tão parcial,
que estamos criando seres humanos incompletos.


Vandana Shiva (Fundação de Pesquisa pela Ciência, Tecnologia e Ecologia)


O Programa de Reorganização Curricular e Administrativa, Ampliação e Fortalecimento da
Rede Municipal – Mais Educação São Paulo trouxe uma série de mudanças significativas em
busca da qualidade social da educação. Nesse aspecto encontra-se a perspectiva da Educação
Integral, que impulsiona a demanda de construção de um currículo que conceba os(as)
educandos(as) como produtores(as) de conhecimentos e que propicie o desenvolvimento de
todas as potencialidades ou dimensões formativas dos sujeitos.

O pensamento sobre uma educação que se pretende integral precisa ser iniciado com
questionamentos importantes: A que tipo de educação se opõe? Quais intencionalidades
possui? Está a serviço do que ou de quem?

Vandana Shiva nos dá pistas a respeito de como iniciar essa conversa ao evidenciar os
conflitos e contradições inerentes ao processo de escolarização ocidental. É preciso
anunciar que ao pautarmos a Educação Integral dentro dessa conjuntura (histórico
sociocultural) estamos buscando favorecer o desenvolvimento de “seres humanos preparados
para lidar com a vida e todos os problemas dela, cidadãos independentes capazes de
exercitar suas decisões e viver suas responsabilidades em comunidade” e isso se opõe à
lógica e usos dos espaços educativos que se perpetuaram como hegemônicos e que têm
colaborado para a criação de “seres humanos incompletos”.
[24]

A base das discussões sobre Educação Integral no Brasil apresenta, dentre muitos, um
princípio básico: as relações entre escola e comunidade. Com isso podemos refletir sobre a
necessidade de ressignificação das práticas educativas sustentadas por currículos e
matrizes curriculares que não apenas se distanciaram das experiências vividas nos
territórios, como também, elegeram uma cultura a ser instituída às custas do silenciamento
de muitas outras. Dentre os problemas centrais dessas escolhas podemos destacar a
fragmentação do conhecimento, a hierarquização de componentes curriculares e a
desarticulação com a vida, fatores esses que se orientam por uma lógica cartesiana que
separa corpo e mente, razão e emoção e promovem um nível máximo de racionalização da
realidade, negando as subjetividades e o papel de sujeito social inerentes a cada pessoa
que compõe o universo escolar.

Isso posto, a defesa de uma construção da Educação Integral na Rede Municipal de Ensino
de São Paulo é fundamentada pela premissa máxima de possibilitar as condições de construção
de conhecimentos que favoreçam o desenvolvimento de nossos(as) educandos(as) em todas as
suas dimensões e culturas e, acima de tudo, que atue contra a lógica que produz a
“incompletude” e a relação desapaixonada com o conhecimento. Anunciamos que a Educação
Integral deve estar a serviço das necessidades e interesses dos grupos sociais existentes
nos Espaços Educativos dessa Rede, considerando e contemplando a interseccionalidade
[25] constituinte de cada
realidade.

Diante disso, apontamos também para a necessidade da discussão em torno da descolonização
do currículo, compreendendo que, entre muitas outras instituições, a escola exerceu e
continua exercendo um papel essencial para a manutenção da hegemonia. Por se colocar a
serviço de uma lógica que hierarquiza, não apenas as relações humanas dentro de uma
estratificação social e racial, mas que elege a cultura “euro-ocidental” como padrão a ser
atingido. Do ponto de vista epistemológico, ainda que somente de forma reprodutiva,
consolida ano após ano um currículo que se mantém desarticulado das realidades dos sujeitos
que compõem a comunidade escolar, rejeita ou ignora formas e caminhos de construção do
conhecimento que não sejam euro-centrados.

Chamamos atenção para a necessidade de admitirmos que existem “formas outras” de produção
do conhecimento, que existem noções de mundo (cosmogonias e cosmologias), lógicas e
fundamentos para além das que nos foram apresentadas como as “melhores” ou pior, como as
únicas. Adotar a perspectiva de descolonização do currículo implica, antes de tudo, em
rever e ressignificar conceitos consolidados culturalmente que justificam e legitimam a
“superioridade” de uma cultura em relação a outras. Para tanto, é preciso descolonizarmos o
nosso pensamento, ou pelo menos admitirmos a existência dessa necessidade. O “pacote” de um
currículo colonizado e colonizador contém visões de mundo, práticas e teorias que
naturalizam a soberania branca, masculina, judaico cristã, heteronormativa e dos padrões de
“normalidade” física e psíquica.

Ao descolonizar o currículo, as representações acerca dos grupos sociais que integram a
realidade das Unidades Educacionais serão problematizadas. Representações que muitas vezes
acabamos assimilando e reproduzindo. Representações de nós mesmos(as) elaboradas por
pensadores externos. Olhares carregados de estereótipos, simplificações, preconceitos e
discriminações, muito semelhantes aos que foram submetidos os povos originários e africanos
durante a colonização.

A defesa maior dessa proposta é construirmos coletivamente um currículo que de fato leve
em consideração a dinamicidade das culturas existentes em nossa sociedade, assim como, a
violência dos processos de silenciamento de determinadas formas de vida e construções de
conhecimentos. Ou seja, não é possível falarmos de emancipação e criticidade se nos
prestarmos a perpetuar um projeto de sociedade que marginaliza e exclui a maior parte da
população.

É nessa perspectiva que a Educação Integral problematiza o currículo, na medida em que
realoca o(a) educando para a centralidade dos processos educativos e ambiciona contemplar
suas diferentes dimensões formativas, levando em consideração a ampliação dos tempos,
espaços e agentes educativos.

Ao buscar a integração dos saberes acadêmicos aos saberes locais, oriundos dos
territórios onde vivem os educandos, põe em cheque a fragmentação cartesiana de conteúdos
e, volta-se para uma dimensão integral do conhecimento a ser produzido.

Dessa forma, vale lembrar que o currículo na Educação Integral não corresponde a uma
justaposição do currículo do turno regular ao currículo do turno expandido, mas sim à
reorientação estrutural de todo processo ensino-aprendizagem, de forma que elementos
significativos da vida dos educandos e de suas comunidades possam ser articulados aos
diversos campos de conhecimento acionados nas práticas pedagógicas escolares.

Para tanto, é necessário aprimorar os mecanismos de caracterização da comunidade escolar
com a participação das crianças, jovens e adultos e seus familiares, demarcando a
necessidade de definir esse campo como ponto de partida do trabalho curricular. Essa busca
por uma educação mais criativa, emancipatória e responsável só se materializa quando a
temática passa a ser prioridade na agenda das políticas públicas e quando a prática
pedagógica recebe visibilidade e é compreendida como espaço de autoria.

Desse modo, assumindo a possibilidade de uma educação comprometida com a emancipação, em
hipótese alguma a mesma poderia ser considerada um processo natural, é preciso
historicizarmos suas construções e compreendê-la dentro da dinâmica das relações de poder
que se articulam aos projetos de sociedade. Ao nos posicionarmos na defesa da educação como
um projeto crítico, estratégico, de resistência e de possibilidades é preciso termos em
mente a necessidade do reconhecimento de que este caminho está ancorado na responsabilidade
compartilhada, no fortalecimento das instituições coletivas, o que inclui políticas
educacionais pautadas pelo compromisso com as classes populares, assim como nas relações
com as demais Secretarias Municipais de São Paulo, tendo em vista uma política pública
integrada a serviço de todas e todos.

Propõe-se, assim, uma escola de Educação Integral, que atue como comunidade de
aprendizagem, na qual as crianças e jovens desenvolvam uma cultura democrática, solidária e
participativa, por meio do protagonismo em atividades transformadoras, aprendendo a ser
autônomo ao formular e construir projetos de vida e de sociedade.

Educação Infantil em Tempo Integral

A Educação Infantil no município de São Paulo traz em sua proposta a integralidade como
um dos seus princípios norteadores das práticas educativas, pois todas as Unidades que
atendem os bebês e crianças de 0 a 3 anos, CEI (conveniado, direto e indireto) e CEMEI
possui uma jornada de 10 horas. Algumas UEs que atendem crianças de 4 e 5 anos (EMEIs)
possuem uma jornada de 8 horas
[26] e, as demais, dois turnos
de 6 horas.

O Projeto Político-Pedagógico de todas as Unidades de Educação Infantil organiza suas
ações tendo como princípio a integralidade do sujeito, pois este é eixo fundamental nas
práticas educativas.

Este princípio, de acordo com a Orientação Normativa nº 01/2013- “Avaliação na Educação
Infantil: aprimorando os olhares”, reconhece o cuidar e o educar como dimensões presentes e
indissociáveis às práticas educativas desenvolvidas com os bebês e crianças.

Podemos afirmar que:

Na Educação Infantil as crianças têm direito ao lúdico, à imaginação, à criação, ao
acolhimento, à curiosidade, à brincadeira, à democracia, à proteção, à saúde, à liberdade,
à confiança, ao respeito, à dignidade, à convivência e à interação com seus pares para a
produção de culturas infantis e com os adultos, quando o cuidar e o educar são dimensões
presentes e indissociáveis em todos os momentos do cotidiano das unidades educacionais.
(ORIENTAÇÃO NORMATIVA nº 01/2013, p.12).

As práticas educativas devem garantir estes direitos pautados em concepções: de
criança/infância, de currículo e de Educação Infantil, compreendendo a criança na sua
integralidade, como pessoa capaz, que tem direito de ser ouvida e de ser levada a sério em
suas especificidades como “sujeito potente”, socialmente competente com direito à voz e à
participação nas escolhas, que consegue criar e recriar, refundar e ressignificar a
história individual e social, como pessoa que vê o mundo com seus próprios olhos,
levantando hipóteses, construindo relações, teorias e culturas infantis.

A concepção de criança/infância ancora as construções sociais, históricas e culturais
construídas pelas múltiplas infâncias e várias formas de ser criança. Essa pedagogia
para/com a infância, estendida até os doze anos, de acordo com o Estatuto da Criança e do
Adolescente – ECA, permeia a Educação Infantil e o Ensino Fundamental e considera uma
concepção de criança que atua na sociedade, na cultura de seu tempo e espaço,
modificando-os e sendo modificada.

Diante desta perspectiva, o currículo:

Emerge e se concretiza a partir dos encontros como acontecimentos dialógicos entre
culturas, histórias, representações e narrativas, que congregam diversas etnias, gêneros,
faixas etárias, gerações sendo traduzidas em ações que envolvem a criança no seu dia a dia
nas Unidades de Educação Infantil, como algo vivo e dinâmico, não havendo assim,
possibilidade de desvinculá-lo da vida. (ORIENTAÇÃO NORMATIVA nº 01/2013, p.14).



Na construção do currículo da Educação Infantil, a Educação Integral é considerada no que
diz respeito, também, ao atendimento em tempo integral, incluindo no planejamento e nas
práticas pedagógicas: as interações, a organização de tempos, espaços/ambientes e materiais
que considerem as necessidades da criança, possibilitando diversas experiências
significativas entre os bebês, crianças, educadores e educadoras, tendo como pressuposto o
desenvolvimento da solidariedade, da justiça, do respeito ao outro, do lúdico, da
criatividade, da autonomia e do imaginário.

A partir das interações entre os bebês e crianças de diversas faixas etárias, entre eles
e os adultos, é que meninos e meninas percebem o outro e as coisas, o mundo, e elaboram
hipóteses e teorias próprias da primeira infância. A qualidade das interações depende das
condições proporcionadas aos bebês e crianças, reafirmando a singularidade de cada um,
percebendo e acolhendo as diferenças.

Essas interações ocorrem num tempo e num espaço que devem ser pensados de maneira
intencional, planejados e articulados no currículo, propondo desafios e experiências que
contemplem a expressão por meio das múltiplas linguagens humanas: a música, o desenho, a
fotografia, a literatura, o teatro, a dança, a escrita, a fala, entre outras.

A organização dos tempos, espaços/ambientes e materiais, reveladores de concepções,
também devem ser planejados e organizados, sendo elementos ativos no contexto de
aprendizagem social, afetiva, cognitiva, assim como, na garantia de educação e cuidado num
contexto agradável e seguro.

A organização dos tempos na Educação Infantil requer que as educadoras e educadores
componham um coletivo reflexivo para a construção de práticas temporais que estejam
alinhadas à garantia do direito de meninas e meninos vivenciarem experiências que sejam
integradas e que lhes permitam o contato com diferentes linguagens, desenvolvimento e
acolhimento de suas manifestações expressivas, conhecimento sobre o mundo, as pessoas e o
que compõe a vida humana. Assim, o tempo passa a ser um parceiro na concretização de
projetos pessoais e coletivos: iniciar, retomar e concluir algo de interesse/necessidade,
contemplar e recolher-se para viver a individualidade e autonomia sem ficar apenas com a
organização do tempo preestabelecido pelo adulto (ORIENTAÇÃO NORMATIVA nº01/2015, p.18).

Sendo assim, não cabe neste currículo uma fragmentação de experiências, de tempo, a
hierarquização do conhecimento e suas áreas de forma progressiva, tampouco pensar em
professores especialistas, uma vez que o educador da infância tem o papel de criar
condições, organizar tempos e espaços, selecionar materiais de forma criativa a partir da
observação dos bebês e das crianças de seu grupo.

Refletir sobre: “quem são estes sujeitos?”; “que necessidades demonstram?”; “quais são
suas curiosidades?”; “que elementos posso trazer para subsidiar e enriquecer suas hipóteses
e pesquisas?”; “que ações e encaminhamentos são necessários para incluir a
família/responsáveis neste processo?”. Estas e outras reflexões garantem a produção das
culturas infantis, o direito de meninas e meninos vivenciarem experiências que sejam
integradas e que lhes permitam o contato com diferentes linguagens, desenvolvimento e
acolhimento de suas manifestações expressivas, ampliando seu conhecimento e aprendizagens
sobre si, o outro, o mundo e as linguagens que compõem a vida humana.

Nas Unidades de Educação Infantil no município de São Paulo, o tempo de atendimento aos
bebês e crianças é maior que a jornada do professor(a). O agrupamento/turma se mantém o
mesmo e há uma troca de professor(a). É importante que se estabeleça coerência, diálogo e
articulação entre as práticas educativas para que as meninas e meninos vivenciem um
processo contínuo e integrado ao currículo, proposto no Projeto Político-Pedagógico da
Unidade Educacional, elaborado coletivamente com todos os atores da prática educativa:
educadoras e educadores, crianças e suas famílias.

Outra articulação importante é pensar num currículo que contemple a infância de maneira
ampliada, considerando que, ao ingressarem no Ensino Fundamental, as crianças permaneçam
nesta categoria, com suas especificidades e experiências valorizadas e reconhecidas na
continuidade do processo educativo ao longo dos Ciclos de Alfabetização e Interdisciplinar.

A Educação Integral no Ciclo de Alfabetização

O conceito e a proposição da Educação Integral encontram-se presentes na agenda da política educacional brasileira, na medida em que seus
fundamentos encontram-se previstos no Plano Nacional de Educação (PNE) e, consequentemente,
nos Planos Municipais (PMEs) e Estaduais de Educação (PEEs).

As perspectivas de Educação Integral apresentadas têm como base a concepção de um
desenvolvimento pleno do ser humano e reconhecem que esse desenvolvimento só é possível
quando se considera que os processos de aprendizagem ocorrem de modo mutidimensional,
quando se observam diferentes dimensões – física, afetiva, cognitiva, ética, estética e
política – e se articulam os diversos saberes da escola, da família, da comunidade e da
região em que o indivíduo se insere.

Reconhece que os educandos são sujeitos de vivências que dependem de processos
educacionais intencionais abrangentes e da abertura do espaço escolar que reconhecem como
condição precípua um currículo capaz de integrar os diversos campos de conhecimento e as
diversas dimensões formadoras da criança, do adolescente, do jovem e do adulto na
contemporaneidade, considerando suas especificidades.

Assim, faz-se necessária uma nova organização do currículo escolar, em que se priorize
muito mais a flexibilização do que a rigidez ou a compartimentalização, o que não significa
tornar o currículo frágil e descomprometido com a aprendizagem do conjunto de conhecimentos
que estruturam os saberes escolares.

Portanto, destacamos que é somente a partir do Projeto Político-Pedagógico, construído
coletivamente, que a escola pode orientar e articular as ações e atividades propostas na
perspectiva da consecução da Educação Integral, baseada em princípios legais e valores
sociais, referenciados nos desafios concretos da comunidade onde está inserida a escola.

A ampliação e organização dos tempos e espaços no Ciclo de Alfabetização

A alfabetização constitui-se uma das prioridades nacionais no contexto atual brasileiro,
considerando os desafios que estão postos para que todas as crianças estejam alfabetizadas
até os 8 (oito) anos de idade, assim como preconiza o Pacto Nacional pela Alfabetização na
Idade Certa (PNAIC).

Garantir as condições necessárias para que se efetive a alfabetização das crianças
brasileiras constitui um compromisso cuja origem remonta à aprovação do Plano de
Desenvolvimento da Educação (PDE), em 2007, assim como, consubstancia-se novamente como
meta expressa no Plano Nacional de Educação estabelecido recentemente por intermédio da Lei
nº 13.005 de 25 de junho de 2014.

O Ciclo de Alfabetização, ditado pelo Ministério da Educação em 2010, também foi
reconhecido como um importante avanço.

A partir desta determinação, os três anos iniciais do Ensino Fundamental passaram a ser
vistos como um bloco pedagógico voltado para ampliar, a todos os educandos, as
oportunidades de sistematização e aprofundamento das aprendizagens básicas.

Em 2012, o Pacto Nacional pela Alfabetização na Idade Certa, compromisso firmado entre os
governos federal, estadual e municipal de alfabetizar todas as crianças até os 8 (oito)
oito anos de idade, ao final do terceiro ano do Ensino Fundamental, se confirma como uma
das principais políticas educacionais do Governo Federal em conjunto com o Programa Mais
Educação, programa indutor do conceito de Educação Integral, que aumenta a oferta educativa
nas escolas públicas por meio de atividades e acompanhamento pedagógico

Em especial o Pacto foi concebido constituindo-se num conjunto de ações e intenções que
contribuem de forma significativa para o debate acerca dos direitos de aprendizagem das
crianças do Ciclo de Alfabetização, favorecendo aos educandos oportunidades significativas
de aprendizagem, a partir de reflexões aprofundadas sobre o processo de alfabetização com
base no letramento.

A alfabetização e o letramento exercem papel estruturante na formação do indivíduo. Por
isso, o olhar para os anos iniciais da educação deve ser cuidadoso e responsável,
principalmente por parte dos municípios e estados a partir da proposição e execução de
políticas educacionais. O direito de aprender e se desenvolver são elementos essenciais e,
ao mesmo tempo, prioritários para o desenvolvimento da equidade social.

A meta de alfabetizar meninas e meninos até os 8 (oito) anos de idade não se cumpre na
esfera exclusiva da linguagem escrita, mas sim de forma contextualizada, ampla, plural,
envolvendo todo o mundo físico e biopsicossocial das crianças. A possibilidade de
apropriar-se de conhecimentos acerca do mundo físico e social, das práticas de linguagem
das capacidades de interagir, de modo autônomo, por meio de textos orais e escritos, de
experimentar situações diversificadas de interlocução na sociedade será oferecida pela
escola nas tantas experiências criativas, imaginativas e sensoriais ofertadas às crianças.

Nesta fase inicial de formação e desenvolvimento humano e de acesso ao mundo letrado, é
necessária uma escola que incansavelmente promova ambientes e tempos prazerosos e,
cotidianamente, inove e se dinamize, trazendo o mundo da criança para dentro da escola.

É estruturar ambientes formativos que tenham como aspectos relevantes a ludicidade, a
fantasia, o mundo infantil que, ao contrário do que se vê hoje, não se encerra na saída da
Educação Infantil. É, ainda, perceber o rito da passagem que deve ser instalado entre
Educação Infantil e Ensino Fundamental, pois a criança de seis a oito anos nutre-se do
presente, do aqui e agora, agindo com a intensidade que traz da Educação Infantil.

Suas potencialidades de ser criança devem ser exaltadas e a cada passo dado devem ser
valorizadas. Esta criança aprende motivada, tendo suas qualidades destacadas. Daí, ser
pertinente investir seguramente num processo de formação continuada, que coloque sobre a
mesa a proposta da escola e revise seus conceitos de alfabetização e letramento que
considere os tempos e os espaços escolares, que seja sensível e atenta às relações que se
estabelecem entre a família e a escola e como este vínculo pode fortalecer o
desenvolvimento dessas crianças.

Propostas e indicativos para se pensar currículo integrado nos tempos e espaços dedicados
à alfabetização e ao letramento passam por possibilidades que visam implementar a
integração de saberes, notadamente a interdisciplinaridade, tanto no campo dos conceitos
como no campo dos métodos.

Posto isso, a alfabetização deve ser entendida e defendida como um processo integrado a
um fazer interdisciplinar sem rupturas de visões de mundo, justamente para atender aos
diversos olhares acerca dos fenômenos da vida, sem, entretanto, perder de vista o todo e a
parte que compõem o mundo das crianças.

Para assumir as aprendizagens básicas às crianças, no tempo organizado em Ciclo, é
preciso assumir outra forma mais diversa, plural e interconectada de conceber a educação e
a escola, o professor, sua formação e, sobretudo, a infância.

Trata-se ainda de conceber um trabalho que não isole o Ciclo de Alfabetização, mas o
considere parte integrante de um processo mais global que é a Educação Básica. Um trabalho
que (re)crie os Projetos Político-Pedagógicos e atue interdisciplinarmente nos currículos.

Nesse processo de aprender, a ampliação do tempo assume grande importância, pois a
aprendizagem requer elaboração, requer realização de múltiplas experiências, requer poder
errar no caminho das tentativas e buscas, enfim, requer considerar os diferentes tempos dos
sujeitos da aprendizagem. Também requer considerar o tempo de cada um dos parceiros da
comunidade: o tempo da escola, que está preso a um calendário e o da comunidade, que flui e
é mais abrangente, que envolve mais experiências que podem ajudar a aperfeiçoar e
direcionar melhor o tempo da escola.

E, tratando-se de um tempo ampliado e pensando na Educação Integral das nossas crianças,
defendemos, especialmente, a inclusão do lúdico no espaço escolar.

A Ludicidade presente na organização do Currículo

Como um ponto de partida para novos debates e reflexões, podemos citar que os direitos de
aprendizagem garantidos para as crianças de seis a oito anos de idade recusam uma escola
estagnada, considerando que a aprendizagem não
se comprime em tempos recortados e em espaços rigidamente previstos.

Ao contrário, exigem uma gestão dinâmica e intensa que assuma e, ao mesmo tempo, promova
reflexões profundas quanto ao seu papel e possibilidades do oportunizar a alfabetização
desde o âmbito curricular até o físico, envolvendo integralmente e quotidianamente a
ludicidade na escola, no fazer pedagógico. Nesta escola, há que se aproveitar todos os
tempos com as crianças.

Contudo, respeitando as peculiaridades contidas no desenvolvimento físico, psíquico e
moral das crianças nesta idade, a presença da ludicidade deve ser o carro-chefe de todas as
práticas da escola. Para tanto, será preciso dinamizar, definir e organizar espaços para
que estas práticas aconteçam, tais como: cantinhos de brinquedos, projeto brincadeiras,
ludoteca, brinquedoteca, estante da magia, varal de fantasias, dentre outras
possibilidades.

Entendemos a alfabetização como um processo de aprendizagem que culmina com a
participação ativa das crianças, em diferentes espaços sociais, em situações em que se
possam produzir e compreender textos orais e escritos com autonomia. Deste modo, há a
defesa que no Ciclo de Alfabetização ocorra
um ensino sistemático do sistema de escrita, de modo articulado às práticas de
leitura/escrita/oralidade presentes nos diferentes componentes curriculares.

É necessário um trabalho que olhe para as crianças em suas potencialidades, em seus
diferentes modos de aprender, em seus diversos ritmos, como processos subjetivos e não mais
em suas carências, crianças consumidoras e também produtoras críticas de culturas, sujeitos
de direitos, neste caso, direito de serem falantes, ouvintes, leitoras, escritores,
autônomas e autorais.

Entender o percurso educativo destas crianças, tendo em vista o direito à alfabetização,
é compreender seus direitos de aprender, brincar, serem únicas e respeitadas. É preciso que
qualquer orientação norteadora sobre a educação das crianças parta das suas existências e
necessidades concretas, compreendendo que o conhecimento do mundo envolve afeto, prazer,
desprazer, fantasia, brincadeira, movimento, poesia, ciências, artes, linguagem, música,
matemática etc.

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